Após dois anos de tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da
Câmara dos Deputados, foi aprovado, na noite desta quarta-feira, 22, no
colegiado, o projeto de lei que altera o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) e proíbe a aplicação de castigos físicos a crianças e
adolescentes.
Chamado até então de Lei da Palmada, o projeto seguirá para o Senado com
o nome de "Lei Menino Bernardo", em homenagem ao garoto Bernardo
Boldrini, assassinado no Rio Grande do Sul. A aprovação só foi possível
após acordo com a bancada evangélica, que vinha obstruindo a votação do
projeto nos últimos anos.
Pelo acordo, o relator, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), acrescentou à
definição de castigo a expressão "que resulte em sofrimento físico ou
lesão" à criança ou ao adolescente. "Não queremos que as crianças sejam
espancadas e tratadas de forma humilhante, seja com castigo físico ou
não", disse Molon.
A bancada evangélica temia a "interferência" da legislação na educação
familiar. O relator enfatizou que a proposta não prevê sanções aos pais
por usar métodos punitivos na educação dos filhos, apenas o
encaminhamento dos pais denunciados ao Conselho Tutelar para orientação
e, no máximo, advertência.
Xuxa. A aprovação era para ter ocorrido na manhã desta quarta, mas houve
confusão. A reunião foi tumultuada porque os deputados discutiam a
redação final. A bancada evangélica tentava evitar que ela fosse
concluída.
Quando a apresentadora Xuxa Meneghel chegou para acompanhar a sessão, ao
lado da ministra dos Diretos Humanos, Ideli Salvatti, o clima tenso na
reunião já havia provocado interrupção dos trabalhos. Os evangélicos
cobravam o presidente em exercício, Luiz Couto (PT-PE), o fim da sessão.
Foi quando o deputado Pastor Eurico (PSB-PE) hostilizou a
apresentadora. Disse que sua presença era "um desrespeito às famílias do
Brasil". "A conhecida Rainha dos Baixinhos, que no ano de 1982 provocou
a maior violência contra as crianças", afirmou, referindo-se ao filme
Amor, Estranho Amor, daquele ano, em que Xuxa aparece numa cena de sexo
com um adolescente de 12 anos.
A maior parte dos deputados, incluindo os que questionavam o projeto,
repudiou a declaração do Pastor Eurico. Eles classificaram a fala de
"violência inaceitável". A apresentadora não se manifestou e, depois de
encerrada a sessão, deixou a comissão sem comentar o assunto. A sessão
acabou sem que o projeto fosse votado.
Avisado da situação, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo
Alves (PMDB-RN), foi ao colegiado e intermediou um acordo: a CCJ se
reuniria à noite para aprovar o projeto. Como tramita em caráter
conclusivo a chamada Lei Menino Bernardo seguirá para o Senado. Após a
confusão da manhã, o líder do PSB na Câmara, deputado Beto Albuquerque
(RS), destituiu seu correligionário Pastor Eurico (PE) da Comissão de
Constituição e Justiça. Para o lugar de Eurico, Albuquerque indicou
outro correligionário, Júlio Delgado (MG).