Dado Villa-Lobos (Foto: Divulgação)
Ele fala de críticas a tributo a Legião: 'Acho que Wagner ficou chateado'. Villa-Lobos lança disco solo na web e descarta mais homenagens: 'Chega'.
"Nada ficará para sempre como antes", canta Dado Villa-Lobos na
primeira faixa de seu segundo disco solo, o novo "O passo do colapso".
Ele explica ao
G1 que a música "Colapso" é
"apocalíptica", mas que a destruição pode ser positiva: "Pode ser o
apocalipse ou 'vamos embora', dá pra resolver", tenta explicar. Na
entrevista, o ex-guitarrista da Legião Urbana, aos 47 anos, mostra mais
interesse em entender as mudanças do mundo e indústria musical de hoje
do que em
repetir o passado.
No tributo à Legião Urbana gravado em maio de 2012, o ator Wagner
Moura, que cantou as músicas da banda, disse que poderia ser a última
vez juntos do guitarrista Dado e baterista Marcelo Bonfá, ex-Legião. Mas
um dos convidados do disco - além de Mallu Magalhães, Paula Toller, Bi
Ribeiro, João Barone, Rodrigo Barba e outros - é Bonfá. "Com o lance da
Legião foi [a última vez]", diz Dado, explicando que o encontro pode
acontecer em projetos que não sejam tributos à antiga banda. "Chega",
diz.
Sobre a repercussão do show gravado em maio de 2012, Dado diz: "Acho
que pegaram muito pesado com o próprio Wagner e a gente por tabela". O
músico diz que críticas não são novidades na história da Legião. "A
gente foi muito esculachado. O Renato era tratado como um débil mental,
messiânico, pela imprensa. Na época a imprensa fazia esse papel, hoje em
dia não, está 'no dedo de cada um'. A gente teve shows bem ruins, só
que ficou ali, naquele lugar onde aconteceu."
Uma das músicas do novo disco, "Filho", foi feita para Nicolau
Villa-Lobos, que interpreta o pai no filme "Somos tão jovens", com
estreia prevista para 3 de maio. A composição veio antes do filme, em
momento delicado de saúde. "Ele tinha um buraco de 4 milímetros no
coração, um
negócio violento. Ficou seis meses parado. Aprendeu a jogar pôquer e hoje é um ‘fodão’ mundial", conta Dado sobre o filho.
Dado Villa-Lobos (Foto: Divulgação)
G1 - Você já disse que tinha dúvidas existenciais ao fazer ‘O passo do colapso’. Quais eram?Dado Villa-Lobos -
Inquietação generalizada. Questionei o motivo de fazer música, para
que, como, quem ouve, onde está o circuito, cadê o mercado. Fiquei me
sentindo um estrangeiro, fora do esquema, não conseguindo achar um
espaço para tocar. Era meio "profeta pregando no deserto", uma sensação
esquisita. Isso foi há cinco anos. E as percepções foram mudando. Disso
tudo saiu um projeto, um disco. E fui percebendo que as coisas mudaram.
Consigo comprar música de novo, pelo celular. Sou contra a música ser de
graça. Pago, faço questão. As pessoas envolvidas têm que ser
remuneradas. Pelo meu telefone comprei discos de meus artistas
preferidos em 2012 : The xx, Cat Power, Dylan. O que não inviabiliza o
meu disco físico, que sai agora. Rolou uma revitalização de ânimos.
G1 - Então quando você canta, em “Colapso”,
que “nada ficara pra sempre como antes, eu sei”, isso pode ser
pessimista e otimista ao mesmo tempo?Dado Villa-Lobos - Exatamente.
A música é meio apocalíptica, bíblica. “Vou derreter o chão, descendo o
morro”. Falo sobre o que acontece todo ano nesse lugar: colapso
ambiental, social, chuvas que mataram mil pessoas em Teresópolis. “Nada
ficará para sempre”. Pode ser o apocalipse, o final, ou "vamos embora,
dá pra resolver".
Eu não conseguia olhar para um CD, era um negócio que dava nojo. O que
me irrita é quando alguém grava um CD e fala que é um cartão de visita,
para tocar ao vivo. Virou um artigo de quinta categoria, perdeu o
valor. Mas acho que as coisas estão retomando o caminho."
Dado Villa-Lobos, músico
G1 - Você colocou o disco inteiro no YouTube. Quando era dono do selo Rock It, imaginou que faria isso um dia?Dado Villa-Lobos - Nunca
imaginei. Hoje quando eu quero ouvir que ainda não tenho, vou ao
YouTube. É uma janela. Mas se o cara se apega, vai querer em um CD, no
celular dele. Há dez anos eu estava fechando a gravadora, pois a
pirataria tinha dominado o mercado. E falei: "Perdi". Chegamos numa
época, lá para 99, em que você enchia o tanque do carro e ganhava um CD.
Ficou absurdo, eu não conseguia olhar para um CD, era um negócio que
dava nojo. O que me irrita é quando alguém grava um CD e fala que é um
cartão de visita, para tocar ao vivo. Virou um artigo de quinta
categoria, perdeu o valor. Mas acho que as coisas estão retomando o
caminho.
G1 - No tributo à Legião Urbana, feito no ano passado pela MTV, o Wagner Moura disse que talvez aquela seria a última vez que veríamos Bonfá e Dado juntos. Mas o Bonfá toca nesse disco.Dado Villa-Lobos - É
que o disco foi gravado antes de aquilo acontecer. Foi em 2010 que
rolou a gravação. Foi antes da Copa do Mundo, o Kassin estava produzindo
o disco da Vanessa da Mata, e ela teve que fazer um show na África do
Sul. Sobrou uma semana para o Kassin. E ele falou para chamar o Barba
[baterista dos Los Hermanos], o Bonfá. O Kassin adora o Bonfá, eu
também. Ele começa a tocar e eu não preciso nem olhar. É uma coisa
natural.
Acho que pegaram muito pesado com o próprio Wagner e a gente por
tabela. (...) Se estivéssemos na Legião, provavelmente a gente seria
esculachado, porque a gente foi muito esculachado. O Renato era tratado
como um débil mental, messiânico, pela imprensa"
Dado Villa-Lobos, músico
G1 - Então o show de tributo foi a última vez com vocês juntos?
Dado Villa-Lobos - Com o lance da Legião foi. O lance da MTV
com o Wagner foi tão polêmico, tão esquisito a repercussão que teve...
Na verdade tinha sido preparado como uma "autocelebração", para lembrar
os 30 anos do Legião, daquelas canções. O convite foi da MTV. O Wagner
topou a ideia, e é muito fã, conhecia todas as músicas de cor. A gente
tentou montar um repertório que passeasse pela história inteira da
banda, desde tocar música que jamais tinha tocado: “A Via Láctea”,
“Esperando por mim”. Não era só o Wagner cantando as músicas, tinha
também Bi Ribeiro, Andy Gill [do Gang of Four], que sempre foi o cara
que admirávamos muito, o Renato era fã. E assim foi. Para mim quem
estava lá viveu realmente uma catarse incrível. Valeu muito a pena. E
não tem mais sentido repetir. Já foi.
G1 - A repercussão e a polêmica te chatearam de alguma forma?Dado Villa-Lobos - Não.
Acho que o Wagner ficou chateado, claro que chateou. Acho que pegaram
muito pesado com o próprio Wagner e a gente por tabela. Era aquele
momento, passou. A Legião acabou, já foi. Se estivéssemos na Legião,
provavelmente a gente seria esculachado, porque a gente foi muito
esculachado. O Renato era tratado como um débil mental, messiânico, pela
imprensa. Na época a imprensa fazia esse papel, hoje em dia não, está
no dedo de cada um. A gente teve shows bem ruins, só que ficou ali,
naquele lugar onde aconteceu. Em cima do palco, você está se arriscando a
cada momento, e a gente sabia disso. O próprio Wagner falou que é isso
que motiva ele a ser artista, disse: "Eu preciso me arriscar". Para ele
foi um grande desafio. Realmente cantar todas as músicas da Legião não é
fácil. Tem toda a questão mítica, a aura, que ainda contribui para a
reação das pessoas.
G1 - Então é possível encontrar com o Bonfá em outros discos, de outros projetos?Dado Villa-Lobos - Encontrar
o Bonfá não tem problema. O que foi colocado é que não vamos fazer mais
aquilo, tocar um show exclusivamente de músicas da Legião. O ápice foi
aquele momento. Não cabe mais. Chega.
Meu filho passou por um procedimento cardíaco quando tinha 20 anos,
implantou um catéter. Ele tinha um buraco de 4 milímetros no coração, um
negócio violento (...) A ideia [da música 'Filho'] era de confortá-lo.
Ele ficou seis meses parado. Aprendeu a jogar pôquer e hoje é um ‘fodão’
mundial."
Dado Villa-Lobos, músico
G1 - Sobre a música “Filho”, como foi a composição? Ele estava dormindo mesmo, como diz a letra?Dado Villa-Lobos - É
versão de uma música que adorava, “Son”, do primeiro disco do Scott
Weiland [ex-Stone Temple Pilots]. Meu filho [Nicolau, 24 anos, irmão da
estilista Miranda, 23] passou por um procedimento cardíaco, quando tinha
20 anos, implantou um catéter. Ele tinha um buraco de 4 milímetros no
coração, um negócio violento, era grande e nenhum pediatra tinha
detectado. Ele fez isso e teve que ficar um tempo de molho, sendo que
jogava muito futebol. A ideia era de confortá-lo. Ele ficou seis meses
parado. Aprendeu a jogar pôquer e hoje é um ‘fodão’ mundial. Ele foi o
brasileiro mais bem colocado no campeonato mundial de pôquer no ano
passado.
G1 - Chegou a acompanhar alguma gravação do filme em que ele te interpreta?Dado Villa-Lobos - Já
viu o filme, ele [Nicolau] está bem, "relax". Mas quem está bem mesmo é
o Thiago Mendonça [que interpreta Renato Russo], ele arrebenta. Lembrei
muito, todos os trejeitos, os jeitos de falar, o jeito da mão dele.
"Baixou" o Renato nele. O diretor me chamou para ver o corte final.
Falei que estava joia. É um bom filme, reproduziu bem o a atmosfera
daquela Brasília de 79 a 85. E tem a cena final que é incrível, um show
da Legião no Rio, com imagens da época.