No dia 16 de março de 2011 escrevi uma coluna aqui mesmo no
Direto da Redação falando do livro de um francês de 93 anos, Stéphane
Hessel, chamado “Indignez-vous”. De lá para cá, Stéphane, um heroi da
resistência na Segunda Guerra Mundial, morreu, mas deixou-nos com seu
pequeno livro (vejam, um livro escrito quando ele tinha 93 anos) uma
lição de vida: “o povo não deve nunca perder sua capacidade de se
indignar…”
As causas dos protestos que ocorrem agora no Brasil são muitas, mas
me consola saber que nosso povo não perdeu a capacidade de se indignar.
Como elas eclodiram juntamente com os eventos esportivos que ou se
disputam agora ou se disputarão nos próximos anos, permito-me reproduzir
abaixo o que escrevi na Gazeta Esportiva, um órgão cuja finalidade já é
claramente definida por seu nome:
“Sou totalmente a favor dos protestos, embora não das maluquices do
tipo de querer transporte público gratuito". Como dizia Milton Friedman,
não existe almoço de graça. O dinheiro tem que surgir de algum lugar.
Subsídios significam apenas que a conta é passada para o contribuinte.
Sou também, como já escrevi abaixo, contra tolices como a de impedir a
construção da hidrelétrica de Belo Monte. Preferem lampiões de
querosene e carros de boi?
Sou, evidentemente, contra quebra-quebras, saques e roubos. Sou, é claro, contra a violência policial.
Aqui nos Estados Unidos convivi diversos meses com o movimento Occupy
Wall Street, em Nova York, e cheguei a pensar em ir lá, mas moro longe.
O movimento durou diversos meses, protestanto contra a roubalheira dos
“big shots” e o desequilíbrio social, com 99% da população ganhando cada
vez menos e 1% ganhando cada vez mais.
Mas foi um movimento pacífico, sem quebra-quebras e sem tiro nos
manifestantes. Só acabou mesmo porque o inverno chegou e é duro acampar
na neve e no gelo.
No Brasil não há inverno (a não ser nas páginas da moda) e aí temos uma grande oportunidade de levar os protestos adiante.
Os manifestantes terão meu pleno apoio (apoio desimportante, bem sei)
se protestarem contra a corrupção de politicos e cartolas que solapa o
país, se protestarem contra as promessas de investimento em educação,
saúde e obras de infraestrura que nunca saíram do papel, contra os
orçamentos para a Copa do Mundo e a Olimpíada (como já aconteceu nos
Jogos Pan-Americanos) que ultrapassam em muito as previsões, sem uma
explicação razoável.
Seria ótimo se ao fim de tudo os corruptos fossem encaminhados,
algemados e expostos à execração popular, para o presídio, em vez de
legislarem contra os juizes que os condenaram.
O que impede o Brasil de se tornar um país desenvolvido é a corrupção
e a indiferença diante da corrupção. Se, a propósito da Copa do Mundo e
da Olimpíada, os protestos populares levarem o país a acordar,
estaremos todos de parabéns. Todos menos os corruptos.
A corrupção custa bilhões de dólares ao país e está na hora de dizer basta.
Mas antes de mais nada devemos impedir os poucos maus elementos de conspurcarem os protestos legítimos.”
Abaixo, ainda no mesmo “post”, abordei outro aspecto:
“Um ponto também importante é a reforma do Judiciário. Como trabalho
no sistema judicial norte-americano, sei que é imensa a diferença que o
separa do brasileiro, onde a Justiça tarda e frequentemente falha. É
incompreensível que processos criminais, trabalhistas e cíveis
arrastem-se por décadas, sujeitos a toda sorte de chicanas”.
A tudo isto, devo acrescentar que reduzir ou cancelar o aumento das
tarifas não será solução. De uma certa forma, apenas agravará, pois,
como eu disse acima, subsídios não resolvem.
O fato é que os governos, em todos os níveis, tem faltado no Brasil
com o dever de fornecer serviços públicos decentes aos cidadãos, nos
transportes, na educação, na saúde. Quem vai ao Brasil e vê o caos nos
aeroportos, o caos no trânsito eternamente congestionado das cidades, a
violência e a corrupção, compreende que nossos governantes estão
totalmente divorciados da realidade da nação.
O sonho de desenvolvimento fácil acabou. O governo está desorientado.
Em grande parte isto acontece porque Brasília é uma ilha de
irrealidade. A tansferência da capital da República para aquelas
lonjuras contribuiu para criar uma classe política que se permite toda a
sorte de desmandos, de escândalos e de corrupção, achando que está fora
do alcance da população.
Não mais.
autor deste artigoJosé Inácio Werneck