terça-feira, 26 de março de 2013

Afinal, quem é o papa Chico ?

O Papa Chico visto por Leonardo Boff e Ivone Gebara.
O Papa Chico visto por Leonardo Boff e Ivone Gebara.

Não há nenhum dúvida quanto à figura do Papa Chico, entronizado há alguns dias em Roma – o novo chefe da Igreja Católica é simpático, tem carisma, sua linguagem direta e calorosa é entendida imediatamente pelos fiéis e sua maneira afetuosa no encontro com as pessoas já conquistaram católicos e não católicos, reação ainda mais viva pelo contraste com o Papa Bento XVI, distante e reservado.
Compreensível, portanto, o entusiasmo do ex-padre Leonardo Boff, um dos ardorosos defensores da teologia da libertação, desde os fins do anos 60 e sob a ditadura brasileira, o que lhe valeu ter sido reduzido ao silêncio, proibido de se manifestar e de ensinar teologia, pelo Papa polonês, João Paulo II. Uma severa punição parecida com a aplicada ao teólogo alemão Hans Kung que, igualmente divergia das linhas mestres da Cúria romana, ambos entusiastas do Concílio do Vaticano II. Boff criticava a esclerose teológica da Igreja e seu isolamento da realidade do mundo.
Leonardo Boff, com doutorado em teologia na Alemanha e falando perfeitamente a língua do país, sempre bem recebido pelos alemães, é frequentemente convidado por organizações progressistas de católicos praticantes mas dissidentes da linha da Igreja, e, por isso, a revista Der Spiegel quis logo saber sua opinião sobre o novo chefe da Igreja e sobre as acusações publicadas, quanto a uma cumplicidade do cardeal Bergoglio com as ditaduras argentinas. A entrevista foi logo reproduzida em outros países e nela, Boff afirma haver um clima revolucionário em Roma.
O Boff de hoje continua defendendo a teologia da libertação mas ela inclui uma visão ecológica de defesa do nosso planeta, para que a vida humana não desapareça. E, num de seus muitos escritos, ele previa o surgimento da mesma cepa, de movimentos libertários diversos, fôssem feministas, indianistas, pela libertação real dos negros e pela defesa do meio-ambiente. Nisso se poderia incluir, por analogia, a eclosão do movimento libertário pelos homossexuais, de nossa época.
Não sendo mais padre, casado, Boff pode se aventurar pelo campo das heresias, sem receio de ser excomungado, porque sabe haver latente na Igreja o inconformismo de católicos progressistas, cujo credo não se fecha na ortodoxia de Roma e é arejado pelas correntes modernas animadoras de uma visão teológica social e ecológica do mundo e da sociedade.
Mas por que Boff defende o Papa Chico no episódio argentino ? Nisso, ele se refere ao premio Nobel da paz, o pianista Adolfo Esquivel, segundo o qual “houve bispos cúmplices da ditadura argentina, mas entre eles não estava Bergoglio” e diz ter conhecido um dos padres jesuítas “denunciados” por Bergoglio (Orlando Yorio), sem que ele jamais tivesse feito tais denúncias.
Boff prefere enterrar o passado, na expectativa de grandes reformas dentro da Igreja, envolvendo o celibato clerical, o uso dos anticoncepcionais e o papel das mulheres, a serem feitas pelo novo Papa, mais uma descentralização da Igreja. Mero sonho de Boff ? Logo saberemos, quando for escolhido o secretário-geral da Cúria – do qual dependerão as transformações, se houver.
Em todo caso, Boff parece impressionado pela humildade do novo Papa, que rompeu com o luxo e vivia modestamente em Buenos Aires, encontrando-se frequentemente com os pobres das periferias. Será essa uma garantia para o surgimento de uma nova Igreja voltada para os pobres e para a solução dos problemas sociais?
Ivone Gebara não concorda com isso. Também pertencente ao grupo da teologia da libertação, doutora em Filosofia pela PUCSP e em Ciências Religiosas pela Universidade de Louvânia, na Bélgica, Ivone vive como freira da Congregação das Irmãs de Nossa Senhora, no que se chama de inserção social, numa cidade de Pernambuco. Tinha sido professora no Instituto de Teologia de Recife, mas ele foi fechado pelo Vaticano em 1999, e pronuncia palestras pelo Brasil e diversos países, sobre uma visão feminista da teologia da libertação, assim como sobre a participação social da mulher e dentro da Igreja.
Num artigo publicado na revista católica Adital e reproduzido num site católico francês progressista Paves, rede católica reformadora, Ivone Gebara critica o segredo envolvendo a eleição do Papa, o silêncio da mídia católica sobre as suspeitas envolvendo o cardeal Bergoglio e sobre suas posições quanto ao casamento para todos e aborto legal.
E suspeita ter havido uma preocupação geopolítica na eleição de um Papa vindo do Sul, como maneira de impedir certos movimentos vindos também do Sul, para contrabalançar a influência dos últimos governos populares latinoamericanos. E, ao contrário do que pensa Boff, ela imagina que um Papa latinoamericano, será o ideal para obstar as tendências políticas inovadoras da região com o objetivo de manter intactas as tradições da família e da propriedade.
Em outras palavras, a Igreja busca descer do pedestal para ser mais popular, porém sem quebrar com sua hierarquia. “Sair nas ruas para dar de comer aos pobres e rezar com os presos, tem um lado humanitário, mas não soluciona o problema da exclusão social existente atualmente em muitos países do mundo”, diz a freira Ivone Gebara.
O Papa Chico poderá com seu sorriso e seu carisma mudar dogmas e comportamentos seculares da Igreja católica? Certamente que não, mesmo porque a Igreja se baseia num livro, a Bíblia, extremamente fundamentalista e conservador que, só numa exegese liberal se pode dele excluir os preconceitos contra as mulheres e condenações claras do homossexualismo, da mesma forma como, no passado ainda recente, justificava a escravidão e o apartheid sulafricano.

 
Rui Martins, jornalista, escritor, líder emigrante, correspondente em Genebra.

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